escrita que faça o leitor pôr-se a dançar
como dar uma festa através da página? carta que seja literalmente convite à dança, literalmente convite - seja a própria festa ali - e você entre na página e ponha-se também em sinais a passear pelo papel em sua ginga safa, recolhendo verbos e adjetivos, num grande jogo de cartas e você é um coringa construindo castelos delas, ganhando tantas liberdades em seu frankenstein de movimentos escritos, sua quimera de tentáculos por todas as folhas, ah!
danem-se as potências outras das letras!
muito mais fazê-las entrar nas carnes, entrar nas artérias, pular no coração, espalhar-se por todos os sistemas nervosos em pulsos vibrantes, calibrando os cabelos, ondeando os pêlos, em ritmo, em ritmo,
alguns tentam transmitir sua festa como se a escrita fosse uma janela transparente;
mas por que não chamar as próprias folhas à festa?
melhor, dar a festa nelas, juntar-se a elas nestas folias, haha;
tudo que posso fazer é escrever dançando e chamar à dança as palavras
se as palavras estão dançando, ora talvez elas só saibam dançar sozinhas,
e estão se balançando tão gostosamente, sinta o suingue da grafia!
ao vê-las dançar alguns ficam com vontade de pôr-se a balançar também,
e, na livraria, os surdos-mudos vão dar o maior baile, vocês vão todos perder;
uma vez escrevendo comecei a dançar na cadeira - pela música das minhas próprias palavras!
sabe o que é pôr-se a fazer o corpo também dizer letras?
fazer os braços esticados, e depois n'outra posição, noutro signo,
e quem se puser a ler o braile mágico da carne vai poder perceber a continuidade entre o lido e o dançado
braile baile braile baile
braile anagrama de bailer
aile em francês, asa
b-aile-r: asar-se
bailar: dar asas a si
acho não existe melhor expressão para uma boa obra musical que escrever dançando;
escrever-dançando
dancescrita
escridança
gosto de saber não são simples as letras se divertindo,
mas também as imagens a que remetem,
que ficam remexendo-se inconstantes,
carnaval conceitual de pares em tango;
assistir aos outros dançarem nos faz querer dançar também - não é o objetivo de tudo?
e não, não me venham com a poesia cantada dos gregos velhos e mortos,
não, ha! não me venham com os sons dessas palavras achar que eles têm ritmo;
ah! não comecem essas histórias de poesia cantada, ah, vão à merda!
sintam os conceitos girarem! sintam as músicas das imagens!
parem com essas interpretações superficiais do som e captem suas vantagens lá nos arrebaldes de sua essência;
manifestos, manifestos,
por que os manifestos são todos cantados?
os oradores põem-se a gritar seus refrões pelos becos;
talvez um jorro de imagens monotônicas também faça os ouvintes arrepiarem
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Um comentário:
cara, uma coincidência: já pensei bastante sobre o paralelo escrita e dança. assim, muito.
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