alguns me perguntaram uma vez
como diabos os pássaros vivem,
como os animais agüentam esse mundo,
se "não têm tv", é o que quase dizem;
e bem que sei que poderiam bem se referir
ao fato de saberem os animais passarem todos os dias iguais,
perambulando pelo esmo-a-esmo do sempre igual,
étrangers, dir-se-ia !
dizendo-se monotonamente:
'bom-dia-como-vai '
'bom-dia-mamãe-morreu '
e afins.

eu rio.
(pobres animaizinhos que habitam os zôo-lógicos destas cabeças!)

mas que então, nessas ocasiões de muito supérfluas,
respondo bravamente, com uma cimitarra bárbara em riste
(para a qualquer momento responder aos seus trejeitos cortando-lhes a cabeça) :

meus caros colegas, e amigos e dançarinos ,
convido-lhes a dissecar de perto as belas orelhas dos lobos e das águias,
e agora ponham-nas em seus pensamentos,
e escorram areias do tempo e os ventos de mil-mares em suas mentes.
que música irão ouvir?

nunca perceberam,
que ao sair nas ruas gélidas,
sentem os ventos roçando-lhes as extremidades,
tentando dizer-lhes uns algos ?
(que talvez indecências e obscenidades, pois que os ventos são grandes servos do dionísio)

se tivéssemos as antenas capazes de captar-lhes as freqüências melodiosas,
ouviríamos aquela rádio poderosa do reino animal,
que passa a tocar em brados absurdos,
e em gritos de horrificar as mais belas esfinges egípcias,
a música-vida, da qual todas as que conhecemos são primas libidinosas,
e que reverbera nos ínfimos nervos e fios de cabelo,
entortecendo a alma, fazendo-lhe uma massagem enforcativa,
masoquismo de mais alto grau.

e daí não nos espantaríamos mais com a apatia animal frente a tudo que lhes ocorre na carne:
pois que estão em transe musical-dionisíaco,
batendo seus corações em ritmo (e como batem os corações dos passarinhos)
em suas velocidades loucas,
saem a pulular os céus em sinfonias dissonantes;
são grandes artistas,
surdos às nossas ordens regadas a docinho e cubo de açúcar,
procurando as correntes de ar mais coloridas, mais saborosas, mais musicais

voar é como tocar numa orquestra,
porque o vento é um instrumento subtilíssimo,
de que todos nossos aparelhos musicais tentam laboriar,
mas que com asas poderíamos fazer-lhe dizer as mais coisas!
as mais coisas!
as mais-coisas!

2 comentários:

b. disse...

gostei especialmente dos coracoes dos passarinhos, mas por um lado, o que sei?

Luisinha disse...

o coraçao do beija-flor pode chegar a quase tres mil batimentos por minuto. e gostei mt mesmo desse texto!