barthes queria voltar ao diário,
proust... é tão quase; (e tão outro!)
essa vontade de sentir-se literário:
espalhar tintas de sentido nas camadas de vida

(ora naquela coxa falta vermelho-amor;
aqueles prédios estão entediados e beges demais;
enquanto naqueles olhos, tão desbotados de lágrimas,
esfrego mais uma camada de azul-marinho-oceano:
e serão os olhos mais aquáticos da minha pintura-lembrança)

escrever ordenhando as canetas: ordenhar a linguagem
leite-néctar de imortalidade, a ser misturado
espalhado em pequenos montes nas palhetas
para pintar o mundo de cor-sabor-memória

(se recusar alimentar os bebês gordos
chamados pelas suas mamães-tantas
"quem é o clichêzinho mais bonito?"
que essas bocas infantis tão edipianas
já não conseguem sugar quase leite algum
e se engasgam em si mesmas: arrotando.)

resolver-se a beber o próprio leite
dobrando em si mesmo: oróboro
o curto-circuito de amamentando as tetas
fazer as canetas se virarem sobre si nas camas,
fugindo de si, em vômitos de círculo:
fugindo-viajando para os longes.

2 comentários:

.luísa pollo disse...

barthes é deus!

maria alice vergueiro disse...

a penultima estrofe aumentada viraria 'lesbos' da sylvia plath